O meu lugar já não parece
meu. O meu pedaço de chão agora tem outro dono. Se antes me sentia
em paz, agora fujo com medo. Os meus dias correm mais rápido, assim
como meus pés atrás da calmaria de antes.
A morte da menina Ana Clara
mexeu com o meu estado. Comoveu até os mais ranzinzas dos sujeitos.
Seu corpo quase inteiramente carbonizado simboliza para mim a
culminância do terror.
São Luís está diferente. A
violência de facções criminosas do presídio de Pedrinhas nos
tornou reféns. Nossas casas, nossos cativeiros. Nossa cidade serviu
nos últimos meses como cenário de guerra, aonde presos são
degolados e mulheres são estupradas na Unidade Prisional. Celulares,
televisores e até freezers foram facilmente malocados nas celas como
num ato de prestígio, regalias, poderio e domínio.
Há uma total improbidade do
governo Sarney quanto ao sistema carcerário maranhense. A realidade
é antiga: muitos presos, poucos presídios, lei brasileira falha,
cheia de brechas e muita burocracia e morosidade. Conveniência e
incompetência ditam os caminhos do governo, que não assume sua
inteira falta de responsabilidade sobre esse caso de emergência no
estado. Verifique abaixo dados sobre a realidade prisional no
estado:
“Uma equipe do CNJ
e do Conselho Nacional do Ministério Público (CNMP) fez neste mês
uma inspeção em presídios do Maranhão. " A extrema violência
é a marca principal das facções que dominam o sistema prisional
maranhense. Um vídeo enviado pelo presidente do sindicato dos
agentes penitenciários mostra um preso vivo com a pele do membro
inferior dissecada, expondo músculo, tendões, vasos e ossos, tudo
isso antes de ser morto nas dependências do Complexo Penitenciário
de Pedrinhas", informou o juiz. Também foi constatado que as
visitas íntimas ocorrem em ambientes coletivos. " Em dias de
visita íntima no Presídio São Luís I e II e no CDP, as mulheres
dos presos são postas todas de uma vez nos pavilhões e as celas são
abertas. Os encontros íntimos ocorrem em ambiente coletivo. Com
isso, os presos e suas companheiras podem circular livremente em
todas as celas do pavilhão, e essa circunstância facilita o abuso
sexual praticado contra companheiras dos presos sem posto de comando
nos pavilhões", relatou o magistrado”.(Mariângela
Gallucci - Agência Estado)
Contudo, ainda há o
descaramento da senhora Roseana Sarney em seu pronunciamento quando
diz: “ não ouçam os boatos na cidade....eu não fujo da minha
responsabilidade....estamos blá blá blá....”
Isso é uma afronta à
inteligência do cidadão maranhense. E mais especificamente à
mulher maranhense, que é esposa, mãe, irmã, avó, tia, ou seja, lá
o que for de crianças, assim como Ana Clara, que morreu sem saber o
porquê, numa noite qualquer, enquanto voltava para casa com sua mãe
e irmã, vítimas, de criminosos que são o resultado ou consequência
de uma política suja e algoz de inocentes no país. Observe a seguir
dados referentes aos crimes no Maranhão:
São
Luís é a 13ª capital quanto ao número de óbitos. A cidade
contava com 25.401 habitantes, segundo dados do Instituto Brasileiro
de Geografia e Estatística (IBGE) no ano de 2010, e ocupa a posição
89 no ranking das cidades.Outras cidades também entram na lista das
150 cidades com mais homicídios: Santa Luzia do Paruá (128º),
Arame (130º), Itinga do Maranhão (132º), Imperatriz (140º) e
Presidente Dutra (143º). São Luís aparece na 255ª posição.
No
Maranhão, foram 204 óbitos em 2000, contra 907 registrados no ano
2010. No Nordeste, a maior parte das Unidades Federativas apresenta
elevados índices de crescimento, com destaque para o Maranhão, cujo
número de vítimas cresceu 344,6% na década.
Quanto dinheiro, quanto
desperdício, quanta maquiagem para mascarar nossa triste sina. Até
quando nosso Maranhão estará fadado a ser um dos estados mais
pobres do Brasil? Um dos estados com mais analfabetos e dependentes
do assistencialismo desse governo populista?
Viver sem liberdade não é
viver. Quero ser mulher no direito e com todos os predicados que
mereço, não por ser frágil ou simplesmente mulher, mas porque
posso gerar vidas. Vidas que não podem findar de maneira tão
absurdamente cruel e truculenta. Ninguém tem esse poder.
Segue abaixo dados
sobre a realidade da violência contra a mulher no Brasil:
Segundo pesquisa, que
foi realizada com base no Sistema de Informações sobre Mortalidade
(SIM), do Ministério da Saúde, ainda calcula que, em média,
ocorrem 5.664 mortes de mulheres por causas violentas a cada ano, 472
a cada mês, 15,52 a cada dia, ou uma a cada hora e meia.As mulheres
jovens foram as principais vítimas: 31% estavam na faixa etária de
20 a 29 anos e 23% de 30 a 39 anos. Ou seja, mais da metade dos
óbitos (54%) foram de mulheres de 20 a 39 anos.
Outro fato revelado
pela pesquisa é que as mulheres negras e pobres são as principais
vítimas da violência. No Brasil, 61% dos óbitos foram de mulheres
negras, que foram as principais vítimas em todas as regiões, à
exceção da Sul. Merece destaque a elevada proporção de óbitos de
mulheres negras nas regiões Nordeste (87%), Norte (83%) e
Centro-Oeste (68%). A maior parte das vítimas tinham baixa
escolaridade, 48% daquelas com 15 ou mais anos de idade tinham até 8
anos de estudo.(Por
Adriana Delorenzo)
A família de Ana Clara foi
destroçada no último dia três de Janeiro com sua mãe e irmã
também queimadas e avô falecido ao receber a notícia em razão de
um ataque cardíaco.
Como não se compadecer com
essa tragédia? Como aceitar essa falsa compaixão tardia do Governo
Roseana que ao longo desses anos todos de mandato não teve compaixão
de suas crianças, trabalhadores, lavradores, estudantes e
aposentados que vivem à míngua nesse estado dilacerado pela
corrupção e impunidade?
Reconheço que temos sim nossa
culpa. Porque se a educação deve ser a arma contra a politicagem e
o desgoverno nesse país, então necessitamos avidamente nos
reeducar quanto ao voto. Escolher conforme o mérito dos trabalhos
públicos prestados à sociedade brasileira.
Se é a redenção eu não
sei, mas se envolver e não se abster daquilo que é nosso, daquilo
que faz parte do ser individual e coletivo em nossa pátria, creio eu
ser vital para a sobrevivência em sociedade.
Por
Karla Sousa Pereira
Coordenadora
de Mulheres JPS Brasil